Amigos do Fingidor

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Banho de chuva


Pedro Lucas Lindoso


É verão no Sudeste. Em janeiro e fevereiro o calor no Rio de Janeiro compete com o nosso de agosto e setembro. Enquanto nessa época de início de ano por aqui temos chuvas. E muita. É o inverno amazônico. As cheias para este ano prometem. As praias começam a sumir e o ribeirinho se prepara para a cheia dos rios.
E chove. Fui menino numa cidade pacata. Havia poucos carros na Manaus dos anos sessenta. E como era gostoso tomar banho de chuva. Nas ruas do centro. Ruas de paralelepípedos.
Ontem mesmo desci para a área externa do condomínio para tomar banho de chuva. A piscina era só um pretexto.
 Meninos de minha geração tinham limites. Tínhamos hora para tudo. Até para dormir, por exemplo. Nove horas. Tomávamos a benção. Escovar os dentes e dormir. Não havia TV. A luz vinha de um gerador barulhento que funcionava até as dez da noite. Para ficar acordado até mais tarde era preciso ter autorização.
 Para tomar banho de chuva também era preciso pedir permissão. Às vezes era proibido. Podíamos ficar gripados ou com tosse. Se a gente não obedecesse e ficasse doente, era peia na certa.
Interessante é que quando se tomava banho de chuva escondido, raramente se ficava doente. A gripe só vinha quando o banho era legitimamente autorizado.
Ah! Os banhos de chuva de minha infância! A água escorrendo no rosto suado. A correria no pátio de nossa casa na Henrique Martins. O quintal de minha vó na Vila Municipal. Chuva amazônica tem pingo grosso, generoso.
Outro dia li um belo poema divertido e encantador, escrito em português e espanhol. “Quando chove a cântaros”. Nele a chuva lava a alma e faz brotar a esperança. A terra quase se mistura com o céu. É assim que acontece com as nossas chuvas amazônicas.
Em Brasília os meninos não iam para rua tomar banho de chuva. A chuva às vezes era até grossa, mas nunca com os nossos abundantes pingos. Muitas vezes chovia fininho, o dia inteiro. Chuva triste, sem graça. Chuva seca, como é seco o clima do Planalto Central.
Quando chove muito, em Inglês se diz: It is raining cats and dogs! Em uma tradução literal, seria “Está chovendo gatos e cachorros” Chovendo muito! A mitologia dos povos nórdicos associa os cachorros aos ventos. Por alguma razão que desconheço os gatos remetem às fortes chuvas.
Aqui usamos a expressão “Chovendo canivetes”. Eu gosto muito de “quando chove a cântaros”. Fica bonito também em espanhol – “cuando llueve a cantaros”.

Mas o que eu gosto mesmo é de nossa chuva amazônica. De banho de chuva!